Trata-se portanto de uma doença crónica incurável, com muitas complicações inerentes e com uma grande predisposição genética. Afecta o indivíduo em todos os aspectos da sua vida, quer seja fisicamente, socialmente, ou a nível familiar.
O pé diabético é uma das complicações mais graves da diabetes, devido ao risco que ostenta para uma necessária amputação do membro inferior.
É importante, nós futuros profissionais de saúde, estarmos atentos a determinados aspectos do pé de um indivíduo diabético, para que assim se possam detectar antecipadamente possíveis problemas e actuar precocemente.
Enquanto discentes, por todas as razões apresentadas, consideramos o tema pertinente para a nossa aprendizagem. Com o actual trabalho achamos que também podemos contribuir para que os profissionais de saúde sejam alertados para este problema e para os sinais/sintomas indicativos de um pé diabético.
Este trabalho tem portanto, como objectivos:
Ø Compreender a anatomia e fisiologia do organismo do pé diabético;
Ø Identificar e compreender as complicações tardias relacionadas com a diabetes que contribuem para o desenvolvimento de problemas nos pés;
Ø Discriminar os componentes de um exame aos pés nos doentes diabéticos;
Ø Reconhecer os factores de risco associados aos problemas do pé diabético
Ø Compreender a importância e aplicação dos meios auxiliares de diagnóstico
A recolha de informação para a realização deste trabalho só foi possível após uma exausta procura bibliográfica, conversação com alguns profissionais de saúde e através de consultas realizadas no Centro de Saúde de Nelas, nas quais estivemos presentes.
2. ANATOMIA/FISIOLOGIA
O pé constitui a extremidade do membro inferior, sendo fundamental para a locomoção, equilíbrio, estética, entre outros.
O tornozelo é responsável por ligar a perna e o pé, sendo constituído por sete ossos társicos.
O astrálogo articula-se com a tíbia e o perónio, formando a articulação tíbio-társica, por sua vez o calcâneo localiza-se abaixo deste, servindo-lhe de suporte.
Seguem-se os metatársicos e as falanges, dispostos de maneira semelhante à dos metatársicos e falanges da mão.
O pé é constituído por músculos extrínsecos e intrínsecos. Os músculos extrínsecos podem dividir-se em três grupos, cada um deles localizado em compartimentos separados na perna (compartimento anterior, posterior e externo).
Os músculos superficiais do compartimento posterior, os gémeos e o solhar juntam-se com o plantar delgado para formar um tendão comum, o tendão de Aquiles.
Os músculos intrínsecos do pé, localizados no próprio pé são responsáveis pela extensão, flexão, abdução e adução dos dedos.
O nervo ciático popliteu interno ramifica-se para
o pé, formando os nervos plantares do pé e a pele que reveste a planta do pé. Outro ramo, o nervo safeno externo fornece parte da inervação cutânea da face posterior da perna e da superfície plantar do pé. Por sua vez o ciático popliteu externo divide-se nos nervos músculo-cutâneo e tibial anterior, responsáveis pela inervação da perna e dorso do pé.
Para além dos nervos acima citados, o nervo femoral inerva também o pé, sendo responsável pela distribuição cutânea sensorial.
As artérias dos membros inferiores formam um contínuo semelhante ao das artérias dos membros superiores.
As artérias que contribuem para a irrigação sanguínea do pé são:
- artéria pediosa (dorso do pé)
- artéria plantar externa e interna (planta do pé)
- artérias digitais (dedos dos pés)
As veias dos membros inferiores são constituídas por grupos profundos e superficiais.
As veias que interferem na circulação sanguínea do pé são:
- veia dorsal do pé (dorso do pé)
- veia plantar (região plantar do pé)
- veia peronial (zona profunda externa do pé)
- pequena safena (bordo externo do pé)
- grande safena
- veia dorsal do pé (dorso do pé)
- arcada venosa dorsal (pé)
- veias digitais (dedos)
3. DIABETES MELLITUS
A diabetes mellitus é caracterizada pela hiperglicemia crónica, devida à ausência de produção de insulina e/ou à sua não acção (insulinoresistência). É caracterizada também pelo possível aparecimento de alterações patológicas nos tecidos de certos órgãos, aparelhos e sistemas, constituindo as complicações tardias da diabetes, causadas, na maior parte, pelas alterações bioquímicas que a hiperglicemia desencadeia RUAS (2000) cit. In COUTO e CAMARNEIRO (2002).
SEGUNDO VIEIRA [et al.] (2001) a diabetes mellitus é uma doença em expansão mundial, estimando-se existirem cerca de 124 milhões de diabéticos em todo o mundo.
Na CIRCULAR NORMATIVA DA DIRECÇÃO GERAL DA SAÚDE (2002) classifica-se a diabetes mellitus em:
Ø Diabetes tipo 1
Ø Diabetes tipo 2
Ø Diabetes gestacional
Ø Outros tipos específicos de diabetes
A diabetes tipo 1 resulta da destruição das células β do pâncreas, havendo a necessidade de existir uma insulinoterapia absoluta, para assegurar a sobrevivência. Na maioria dos casos a destruição das células β dá-se por mecanismo auto-imune, e neste caso denomina-se diabetes tipo 1 autoimune, no entanto, em outros casos não é possível detectar a possível causa, nem a existência de um processo auto-imune e neste caso designa-se diabetes tipo 1 idiopática.
No momento do diagnóstico, os indivíduos apresentam-se normalmente magros e é mais frequente aparecer em pessoas com menos de 30 anos, embora possa aparecer em qualquer idade.
A diabetes tipo 2 é a forma mais frequente de diabetes, existindo uma insulinopenia relativa, com maior ou menor grau de insulinoresistência. Geralmente surge após os 40 anos, com início progressivo, os indivíduos são geralmente obesos, há na maioria dos casos predisposição genética
No caso da diabetes gestacional, aparece durante a gravidez e é documentada pela primeira vez nesse período.
Nos outros tipos de diabetes considera-se as situações em que a diabetes é consequência de um processo etiopatogénico identificado, como por exemplo resultante de uma doença pancreática.
Segundo a CIRCULAR NORMATIVA DA DIRECÇÃO GERAL DA SAÚDE (2002), consideram-se os seguintes critérios de diagnóstico:
a) glicemia de jejum 126 mg/dl (7 mmol/l)2
b) glicemia ocasional igual ou superior a 200 mg/dl (> 11,1 mmol/l)
c) anomalia da glicemia em jejum, definida pelo valor da glicemia de jejum entre o valor normal (<110 mg ou < 6,1 mmol/l) o valor diagnóstico de diabetes (≥ 126 mg/dl ou ≥ 7 mmol/l)
d) tolerância diminuída à glucose
4. COMPLICAÇÕES TARDIAS DA DIABETES
Segundo COUTO e CAMARNEIRO (2002), as complicações tardias resultam fundamentalmente de um mau controlo metabólico e atingem sobretudo as artérias e o sistema nervoso periférico. Surgem se não existirem determinados cuidados e só se tornam visíveis após a evolução da doença, nomeadamente anos depois de diagnosticada.
Estas complicações são devidas a vários factores, nomeadamente: hiperglicemia, alterações metabólicas e duração da doença, entre outros.
Quando os níveis de glicemia se mantêm elevados durante muito tempo, vão ocorrer lesões nos pequenos vasos sanguíneos, afectando assim a circulação. Se não se fizer a compensação e estabilização desses níveis, a grande circulação também pode vir a ser comprometida, havendo a formação de placas de ateroma.
Os problemas mais comuns são: nefropatia, retinopatia, doença cardiovascular e doença vascular dos membros inferiores.
Macroangiopatias
Segundo CASAS (????) a ateroesclerose manifesta-se pelo estreitamento do lúmen vascular das artérias devido à acumulação, nas suas paredes de gorduras ou de outras substâncias como cálcio, o que vai dificultar a livre circulação do fluxo sanguíneo e consequentemente há uma redução do aporte de oxigénio aos tecidos o que favorece a ocorrência de processos trombóticos.
Os diabéticos ressentem estas manifestações mais antecipadamente do que o resto da população, pois pensa-se que o desenvolvimento precoce da aterosclerose é acelerado devido a um conjunto de factores, como sejam, a hiperglicemia, a hiperinsulinemia e dislipidemia e hiperfibrinogenemia, embora não esteja bem estabelecida essa relação.
Quando há um estreitamento das artérias dos membros inferiores a circulação nos pés torna-se mais difícil, havendo um comprometimento do aporte do oxigénio aos músculos e à pele, levando ao aparecimento de claudicação intermitente por anóxia muscular, palidez e sensação de frio na pele, lesões isquémicas e gangrena.
Microangiopatias
A microangiopatia diz respeito à lesão dos pequenos vasos sanguíneos. A nível histológico, observa-se a proliferação das células endoteliais e depósitos de material PAS-positivo, na membrana basal das arteríolas, dos capilares e das vénulas, com diminuição subsequente do seu calibre (CASAS, ????).
As suas manifestações mais importantes são a retinopatia e a nefropatia.
a) Retinopatia diabética
CASSMEYER (1995) cit. In COUTO e CAMARNEIRO (2002), refere que as lesões da retina passam por três estádios, no primeiro observam-se pequenas dilatações dos vasos retinianos, no segundo estádio já se observa uma hemorragia e formação de exsudatos e pode evoluir até o terceiro estádio designado retinopatia proliferativa.
As lesões da retina, podem portanto, diminuir muito a visão levando mesmo à cegueira.
Por todas as alterações que podem ocorrer na retina de um indivíduo diabético, é aconselhável que o diabético vá ao oftalmologista pelo menos uma vez por ano.
b) Nefropatia diabética
A nefropatia diabética é devida à alteração dos pequenos vasos dos rins.
A microangiopatia a nível do rim manifesta-se por glomérulo-esclerose difusa e é caracterizada pelo espessamento da membrana basal dos capilares do glomérulo. Estas alterações da membrana basal levam a um aumento da permeabilidade capilar às proteínas, que se manifesta por proteinúria (COUTO e CAMARNEIRO, 2002).
As lesões glomerulares, juntamente com a ateriosclerose bloqueiam os canais vasculares e os glomérulos, levando à insuficiência renal, em que haverá necessidade em se recorrer à hemodiálise.
Muitas vezes um diabético tem também associada hipertensão arterial, que irá ser uma agravante da nefropatia.
Se houver uma quantificação de albumina na urina, a nefropatia poderá ser detectada precocemente.
c) Neuropatia diabética
O envolvimento dos troncos nervosos deve-se fundamentalmente a duas causas, por um lado a alteração microangiopática que dificulta o aporte adequado de oxigénio aos vasos e por outro lado pensa-se que o sorbitol que se forma a partir da glucose por intermédio da aldolase-redutase, possa exercer um efeito tóxico sobre os nervos. A neuropatia é geralmente simétrica e distal, e incide tanto na função das fibras nervosas sensitivas como nas fibras nervosas motoras e no sistema nervoso autónomo (CASAS,????).
Os distúrbios manifestam-se pela diminuição ou abolição da sensibilidade térmica, dolorosa e táctil, e neste caso é chamada neuropatia sensitiva, assim como quando afecta a motricidade muscular é designada de neuropatia motora.
Ocorrem também alterações a nível dos nervos do sistema nervoso autónomo, que é responsável pela inervação dos vasos sanguíneos. Manifesta-se por alterações a nível do controlo da bexiga, função sexual, tracto gastro-intestinal, mecanismos de sudação e reflexos cardiovasculares CASSMEYER (1995) cit. In COUTO e CAMARNEIRO (2002).
Ao nível dos pés a neuropatia pode causar anidrose, que se manifesta por xerodermia e incapacidade para a regulação térmica e pode associar-se à hiperidrose de compensação noutras regiões do organismo (CASAS,????).
A diminuição e perda dos reflexos e da força traduz distúrbios musculares, e no extremo podem culminar na paralisia. As deformações consecutivas às parestesias de grupos musculares, como a subluxação dorsal dos dedos dos pés, a depressão das cabeças dos metatarsos, pé cavo e os dedos em forma de martelo, fazem com que a distribuição do peso corporal em posição ortostática não seja normal, dificultando a adaptação aos sapatos, dando origem a calosidades.
5. PÉ DIABÉTICO
Segundo CASTRO e PIMENTA (2002) o pé diabético é, hoje em dia a complicação mais frequente da diabetes mellitus e aquela em que o seu aparecimento se processa mais precocemente.
Pé diabético seria então a infecção, ulceração e/ou destruição de tecidos profundos associados com anormalidades neurológicas e vários graus de doença vascular periférica no membro inferior.
De uma forma prática e simples, considerando a frequência de alguns sinais, poder-se-à dizer que quando se examinar os pés de um doente diabético e se notar alteração da sensibilidade da pele, presença de hiperemia, hipertermia, edema, deformidades, calos, feridas (ulcerações) com ou sem secreção ou gangrena, está-se diante de um pé diabético.
A tríade composta por neuropatia, doença vascular periférica e infecção está relacionada com gangrena e amputação.
5.1 FISIOLOGIA
Para VIEIRA [et. Al] (2001) a problemática do pé diabético deriva de duas estruturas: as artérias e os nervos.
A neuropatia e a isquémia podem estar ambas presentes, no entanto a gravidade de um quadro isquémico sobrepõe-se sempre a um problema neuropático e vice-versa.
CASTRO e PIMENTA (2002) referem ainda que, a hiperglicemia é responsável por várias outras alterações que facilitam o aparecimento de possíveis problemas nos pés, nomeadamente:
a) diminuição das defesas imunológicas devido à redução de mecanismos como a fagocitose e a função bactericida;
b) rigidez articular secundária à glicação do colagénio
Quadro 1: Factores responsáveis pelo desenvolvimento do pé diabético
Fonte: COUTO e CAMARNEIRO (2002)
5.2 PÉ NEUROPÁTICO
O pé neuropático é quatro vezes mais frequente que o pé isquémico.
Segundo BOAVIDA e MATOS (1988), este caracteriza-se pela alteração da sensibilidade superficial (dolorosa e térmica) que muitas vezes precede a perda da sensibilidade profunda (táctil e vibratória). De acordo com SERRA (????), também é caracterizado pela existência de “pulsos periféricos palpáveis (pedioso e/ou tibial posterior) e uma forte expressão da neuropatia. Há ausência de reflexo aquiliano”…
Na opinião de SERRA (????), “a polineuropatia periférica (sensitiva, motora e autónoma) deriva da degenerescência dos axónios iniciada pela parte terminal e tão mais fácil quanto mais longos eles forem. Como o máximo tamanho ocorre em ambos os membros inferiores, ela é bilateral e predominante nos pés. Parece também ser de início tão mais fácil quanto menos mielina revestir os axónios”. No entanto, a causa da degenerescência nervosa não é de todo conhecida, constituindo os longos períodos de hiperglicemia o principal factor desencadeante (CASTRO e PIMENTA, 2002).
Segundo BOAVIDA e MATOS (1988) a lesão dos neurónios motores leva a uma atrofia dos pequenos músculos intrínsecos dos pés conduzindo a uma deformação destes, com dedos em martelo ou em garra, desenvolvem-se assim pontos de alta pressão que levam ao espessamento da pele com a consequente formação de calosidades, destruição dos tecidos subjacentes e consequente ulceração.
A neuropatia provoca um aumento do fluxo sanguíneo dos pequenos vasos, devido à abertura dos shunts arterio-venosos. A hiperperfusão sanguínea é uma das características mais comuns.
O pé neuropático:
Apresenta-se quente (dois a três graus mais quente que a temperatura ambiente), devido ao aumento do débito sanguíneo
Apresenta os dois pulsos palpáveis (pedioso e tibial)
Mostra ausência de sensação à picada no hallux
Desenvolve ausência de sensibilidade vibratória no maléolo externo com diapasão a 128 Hz
Tem ausência de reflexo aquiliano
Evidência pele seca e quebradiça
Edemaciado
Com dedos deformados
Com formigeiros
Com hiperqueratoses nas zonas de maior pressão
VIEIRA [et. al.] (2001) referem que o pé neuropático pode complicar-se para:
à úlcera neuropática
à necrose digital
A deformidade osteoarticular pode constituir uma consequência da neuropatia, a hiperperfusão afecta o tecido ósseo provocando osteopenia, as fracturas e a destruição articular são responsáveis pela deformidade consequente.
O processo ulcerativo na maioria dos casos é indolor e por isso esta situação é menosprezada pelo doente, e portanto esse facto facilita a progressão da úlcera e também a sua possível infecção (CASTRO e PIMENTA, 2002).
5.3 PÉ NEURO-ISQUÉMICO
A patologia do pé isquémico depende essencialmente da oclusão do lúmen das artérias dos membros inferiores, que resultam de processos ateroscleróticos e que envolve essencialmente as artérias tibiais e popliteas VIEIRA [et. al.] (2001).
Normalmente a isquémia do pé diabético é assinalada pela ausência dos pulsos tibial posterior e pedioso à palpação.
O pé apresenta-se com as seguintes características:
Pele fina, cianótica com o pé elevado;
Unhas quebradiças
Ausência de pêlo
Ausência de pulsos
Diminuição da temperatura
O doente segundo BOAVIDA e MATOS (1988) pode apresentar-se com claudicação intermitente e em casos de isquémia mais avançada, com dor em repouso, normalmente na “barriga das pernas”.
As úlceras no pé isquémico assemelham-se às úlceras de pressão, essencialmente na sua localização (margem do pé, hallux...), a necrose digital pode também instalar-se e evolui rapidamente CASTRO e PIMENTA (2002).
Quadro 2: diferenças entre o pé neuro-isquémico e o pé neuropático
Fonte: VIEIRA [et. al.] (2001)
6. PREVENÇÃO/ENSINO
A maneira de prevenir lesões no pé do diabético é educando o diabético sobre os cuidados a ter com a higiene dos pés, o corte das unhas, o tipo de meias e a escolha de calçado.
Higiene
Segundo AZEVEDO [et al.] (2001), devem lavar-se os pés todos os dias com sabão ou gel de pH ácido (5.5). Esta lavagem não deve ser superior a 5 ou 10 minutos, para evitar a maceração e a perda excessiva de camadas córneas. Quando necessário, usar um toalhete ou escova macia, mas nunca escovas de pêlos rijos.
Deve verificar-se sempre a temperatura da água, que deve ser morna e não superior a 37ºC. Segundo CASAS (????) a temperatura da água pode ser testada com o cotovelo ou através de um termómetro de banho, pois quando se perde a sensibilidade nos pés, não se consegue sentir se a água está demasiado quente, o que pode levar a queimaduras.
Deve-se secar bem os pés, dando especial atenção aos espaços interdigitais, usando uma toalha macia, não muito grossa, com o objectivo de caber bem entre os dedos. A secagem deve ser por contacto e não por fricção.
Quando a pele é seca deve hidratar-se com um creme gordo, vaselina ou outro creme hidratante indicado pelo médico; nos casos de pele húmida deve usar-se pó anti-transpirante para manter os pés secos e limpos.
Segundo CASAS (????) “convém evitar o emprego de cremes irritantes ou abrasivos, talcos ou anti-sépticos agressivos, bem como a aplicação destas substâncias entre os dedos, onde podem causar maceração da pele”.
Unhas
Estas só devem ser cortadas após a lavagem dos pés, enquanto estão macias e limpas. Deve-se usar uma tesoura de ponta achatada ou um alicate próprio. É essencial relembrar-se que as unhas devem ser cortadas a direito, limando as arestas laterais com lima de cartão.
Em certos casos, estes cuidados devem ser executados por outra pessoa.
Meias
Devem ser macias, de algodão ou lã, visto absorverem melhor a transpiração. É essencial que sejam ajustadas ao pé, sem pregas nem dobras, que não garrotem, para não dificultar a circulação sanguínea.
As meias devem ser mudadas diariamente e nunca usar meias remendadas.
É importante que, sempre que possível, se usem meias de cor clara, para inspeccionar melhor qualquer tipo de serosidade.
Sapatos
O calçado deve deixar respirar os pés, devendo por isso ser de couro.
As características essenciais do calçado são:
v ajustado ao pé;
v moldado ao pé deformado;
v biqueira alta e larga;
v com tiras de velcro ou cordões;
v tacão de 4cm e com base de apoio.
É aconselhável calçar sapatos novos de forma gradual 30 minutos por dia, mudar de sapatos de 2 em 2 dias e evitar sandálias abertas.
Convém que o interior do calçado seja examinado diariamente para descobrir a existência de gretas, pregos ou relevos irregulares. De acordo com CASAS (????), “em caso de deformações anatómicas devem usar-se sapatos ortopédicos”.
7. OBSERVAÇÃO DOS PÉS
A observação dos pés é importante para prevenir quaisquer problemas. Devem-se observar depois do banho, antes de calçar meias e sapatos, num local bem iluminado. Para uma boa observação deve-se usar um espelho e se necessário pedir ajuda a um familiar.
Observação do pé afim de verificar alterações:
Na temperatura:
Os pés devem estar igualmente quentes.
Um pé muito quente significa infecção, enquanto que, um pé frio é sinónimo de circulação comprometida.
No tamanho:
Uma tumefacção é sinal de infecção sob a pele.
Na cor:
Quando há diminuição da irrigação sanguínea, as extremidades apresentam-se cianosadas ou esbranquiçadas.
Na pele:
É essencial verificar a existência de vesículas, soluções de continuidade, edemas, micoses, queimaduras ou serosidade.
Da sensibilidade:
Deve pesquisar-se a sensibilidade táctil com o monofilamento e se esta se encontrar diminuída ou ausente, é sinal de neuropatia.
Do pulso:
A ausência de qualquer um dos pulsos, quer o tibial posterior quer o popliteo, é sinónimo de isquémia.
Deve-se evitar:
Ø Sapatos altos, largos ou apertados;
Ø Ligas, meias ou ligaduras apertadas;
Ø Pomadas para calos;
Ø Água muito quente para banho;
Ø Limas metálicas;
Ø Sacos de água quente, almofadas de aquecimento, cobertores eléctricos;
Ø Permanecer em excesso junto de aquecedores, braseiras, lareiras, pois podem provocar queimaduras devido à hipersensibilidade;
Ø Andar descalço em qualquer tipo de piso, a fim de evitar traumatismos.
Como prevenir novas lesões?
- Educar o doente e família;
- Fazer cuidados podológicos, quinzenal, mensal ou trimestral;
- Usar sapatos especiais confeccionados para redistribuir o peso corporal para outras áreas afastadas do local previamente lesado;
- Palmilhas especiais;
- Fazer calçado moldado, quando há deformidades do pé, adaptado a cada “caso”;
- Pedir apoio médico sempre que necessário e quando se verificarem alterações nos pés (parestesias, bolhas, calos ou edema);
- Aconselhar o doente a recorrer a uma unidade de saúde à mínima lesão;
- Incentivar o doente a não faltar ás consultas marcado;
- Manter um bom controlo metabólico.
8. MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO
Para despistar a existência de um pé diabético utilizam-se testes e exames auxiliares de modo a aumentar a capacidade diagnostica.
Os testes neurológicos envolvem a pesquisa da sensação vibratória, táctil, térmica, da sensibilidade protectora plantar e a localização de áreas de maior pressão onde se formam os calos, as úlceras, etc.…O exame vascular permite a palpação dos pulsos e a realização do doppler, entre outros, enquanto o exame clínico pode constatar a presença de infecções, deformidades e úlceras.
Deste modo, com o intuito de avaliar a neuropatia pode ser utilizado o monofilamento de Semmens-Weinstein, o algodão, o palito, o martelo e o diapasão. Para avaliar a angiopatia usa-se o fotopletismógrafo, o doppler, e mede-se ainda a tensão transcutânea de oxigénio.
Monofilamento de Semmens-Weinstein
Este avalia a sensação de pressão (sensação protectora).
Durante o exame devem ser testados nove pontos na região plantar e um na região dorsal. Na região plantar pesquisa-se no primeiro, terceiro e quinto dedos, na primeira, terceira e quinta cabeças metatarseanas, nas regiões laterais do meio pé e junto ao calcâneo.
Na região dorsal pesquisa-se entre os primeiros e segundos dedos de ambos os pés (fig. 1).
A incapacidade do doente em sentir o filamento em quatro ou mais pontos testados, demonstra neuropatia sensitiva (ausência da protecção dos pés).
Fig.: 1 Locais a testar com o monofilamento
FONTE: projecto salvando o pé diabético
O exame sensorial deve ser efectuado num ambiente calmo e relaxado. O doente apenas deverá responder sim / não, esquerdo / direito ás questões que irão ser colocadas. Aplicar, primeiro, o monofilamento nas mãos do doente (ou no cotovelo ou testa) de modo a que o doente saiba o que deve esperar sentir.
O doente não deve conseguir ver se o examinador aplica o filamento nem em que local (pode-se solicitar ao doente que mantenha os olhos fechados durante o teste).
Ao aplicar o monofilamento este deve manter-se perpendicularmente em relação à área testada, a uma distância de um a dois centímetros. Deve ser aplicada uma força suficiente para fazer com que o filamento se curve ou entorte. A duração total de aproximação, do contacto com a pele e de remoção do monofilamento, não deve exceder dois segundos.
Se o monofilamento escorregar pelo lado, deve-se desconsiderar a eventual resposta do doente e área em causa terá que ser testada novamente mais tarde.
Os locais a serem testados deverão ser escolhidos ao acaso.
Quando existem áreas ulceradas, necróticas, cicatriciais ou hiperceratóticas o filamento aplicar-se-à ao longo do perímetro das mesmas. Não se deve permitir ainda que o filamento deslize através da pele ou exceda um contacto repetitivo no local do teste.
Caso o doente não responda à aplicação do filamento num determinado local, deve-se continuar a sequência ao acaso e voltar-se posteriormente àquele local para confirmar novamente a resposta.
Depois da utilização o monofilamento deve ser protegido, tendo o cuidado aquando da manipulação de não o amassar ou quebrar.
As pessoas idosas demoraram algum tempo para se orientarem sobre o que está a ser feito. Deve-se evitar perguntar sobre a sensibilidade do monofilamento no local para não induzir a resposta. Quando existem calos e/ou calosidades tem que se avaliar a região circundante, porque os doentes em princípio não sentirão o monofilamento nessas áreas.
As grandes vantagens deste teste são a sua fácil realização e o seu baixo custo.
A sensação profunda pode ser avaliada através do teste do martelo, em que com o auxílio do martelo se vai pesquisar o reflexo do tendão de Aquiles.
Diapasão
O diapasão utiliza-se para pesquisar a sensação de vibração (sensibilidade vibratória) no pé do diabético.
Pode usar-se um diapasão com cerca de cento e vinte e oito Hz de frequência aplicado à ponta do hallux e de outras saliências ósseas.
O teste deve ser realizado num ambiente calmo e relaxado. Inicialmente o diapasão deve ser colocado sobre o pulso, o cotovelo ou a clavícula do doente de modo a que ele saiba o que será testado.
Tal como acontece na realização do teste com o monofilamento de Semmens-Weinstein o doente não deve ver onde o examinador aplica o diapasão. Este é aplicado sobre a parte óssea dorsal da falange distal do halúx.
A aplicação terá que ser efectuada na perpendicular e com uma pressão constante. Esta aplicação terá que ser repetida mais duas vezes, alternando, com pelo menos, uma simulação (o diapasão não vibra).
O teste é positivo quando o doente responde correctamente, apelo menos, duas das três aplicações, e negativo, isto é, em risco de ulceração, com duas a três respostas incorrectas.
Se o doente é incapaz de perceber a vibração no halúx, o teste é repetido em segmentos mais proximais, como o maléolo ou a tuberosidade da tíbia.
A desvantagem do diapasão é que este não é capaz de identificar a perda de sensibilidade vibratória precocemente.
Doppler
O teste com o Doppler é um procedimento não invasivo que permite determinar a pressão sistólica no tornozelo.
Este é o mais largamente usado, através do índice de pressão tornozelo-braço e da medida da pressão sistólica do tornozelo.
A doença vascular periférica apresenta maior probabilidade de ocorrência em pessoas com diabetes. É por isso que os pulsos devem ser palpados e ouvidos através do Doppler. É salientar os pulsos das artérias tibiais posteriores e pediosas dorsais.
Caso haja ausência de pulsação, as pulsações das artérias poplíteas e femurais devem ser examinadas.
O índice de pressão tornozelo-braço é igual à pressão sistólica do tornozelo dividida pela pressão sistólica do braço, medidas com o doente em posição supina. O resultado abaixo de 0.9 indica a presença de doença arterial oclusiva. A pressão sistólica do tornozelo quando é menor que 50 mmHg, associada à presença de úlcera ou gangrena é indicativo de isquémia crítica. No entanto devido à calcificação da camada média das artérias, uma das características da angiopatia diabética é que as pressões nos tornozelos podem falsamente altas e portanto, não confiáveis.
Tensão tanscutânea de oxigénio
Esta é medida menos usada. Apenas é sugerida para suplementar as medidas anteriores e para avaliar a probabilidade de cicatrização das úlceras.
9. CONCLUSÃO
O doente diabético coloca vários problemas à equipa de saúde que deve ser pluridisciplinar para lhe poder dar resposta e assegurar uma melhor qualidade de vida a estes doentes e suas famílias.
Com a realização deste trabalho podemos aprofundar os nossos conhecimentos acerca da problemática do pé diabético.
O pé diabético fica sujeito a diversas agressões das quais não se pode defender e que acarretam lesões graves, como sejam as úlceras, infecções e necrose que podem evoluir para gangrena e consequente amputação.
Foi dada especial atenção à prevenção e a observação do pé diabético, visto que, o primeiro ponto fundamental para reduzir as amputações é a observação sistemática dos pés quando o diabético comparece nas consultas de rotina. O exame clínico, desprovido de meios sofisticados de avaliação da neuropatia ou da isquémia é considerado perfeitamente suficiente para detectar lesões de risco. No pé neuropático, as calosidades devem ser cuidadosamente investigadas e avaliadas como anormalidades que comprimem os capilares e os tecidos adjacentes, facilitando a necrose e a ulceração, necessitando de desbridação periódica. A palpação dos pulsos é fundamental para individualização do pé isquémico.
O trabalho realizado foi pertinente visto ter uma aplicação prática no estágio do Centro de Saúde.
Finalizando desejamos realçar que os nossos objectivos só serão totalmente atingidos aquando da realização da conferência sobre o tema.
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