Plano de Cuidados

Cuidar de idosos portadores de doenças crónicas constitui uma realidade para muitas famílias. O domicílio é ainda considerado o melhor local para o idoso envelhecer, uma vez que permanecer junto da família, significa garantir a autonomia, a identidade e a dignidade da pessoa.  Assim, os familiares, participantes nos cuidados, procuram desempenhar as actividades que colmatem as necessidades da pessoa no próprio local onde residem. Apesar dos esforços despendidos para garantir a melhor qualidade de vida possível, de acordo com as possibilidades da família, a doença acentua, frequentemente, os sentimentos de fragilidade, dependência, insegurança e preocupação por parte da pessoa idosa. Segundo Catani citando imageDiogo & Duarte,  “o estado de doença acarreta algumas repercussões psíquicas inevitáveis, como preocupações, angustias, medos, alterações na auto-imagem e alguns níveis de dependência.” (Diogo & Duarte, 2002, pág.).
A situação de dependência pode implicar que o indivíduo não seja capaz de desempenhar as actividades de vida diária de forma autónoma e satisfatória, necessitando da presença de alguém que o “ajude”, durante longos períodos, recaindo habitualmente a escolha sobre um elemento da família. É nestes momentos, que este assume o papel de cuidador informal por ter uma responsabilidade culturalmente definida ou vínculo afectivo, implicando uma reorganização da dinâmica familiar. “para enfrentar
a situação de doença, a família tem muitas vezes de restruturar as regras, o padrão de funcionamento e organização, surgindo assim novas formas de funcionamento” (Martins, 2006, p.79). A família ao assumir o papel de cuidador confronta-se com pressões e imprevistos que sozinha tem dificuldade em resolver.
“... a família ou a pessoa mais directamente envolvida na prestação de cuidados, sobre a qual recai maiores responsabilidades pela prestação de tarefas e actividades, entram em situação de crise e rotura manifestando, entre outros sintomas, tensão, constrangimento, fadiga, stress, frustração...” (Martins, 2006, pág. 61).
Neste contexto, justifica-se que o enfermeiro desenvolva esforços com o objectivo de identificar as necessidades e preocupações do elemento cuidador, de forma a que seja possível uma intervenção adequada e individualizada.
 “a promoção do bem–estar dos cuidadores e a prevenção de crises tornam-se aspectos importantes, que merecem por parte dos profissionais de saúde uma atenção particular, pois deles dependem os doentes a seu cargo, bem como a sua permanência no seio da família e da comunidade” (Martins, 2006, pág. 62).
A dependência do doente, o grau de exigência dos cuidados, o tempo utilizado na prestação dos mesmos, o problema e a patologia em questão, as situações resultantes das patologias existentes, podem resultar em ansiedade por parte da família. O facto de não saber como lidar com determinados sintomas, como é o caso da incontinência,  desenvolve sentimentos de impotência por incapacidade de resolução de problemas, implicando por vezes, opções desadequadas à situação da pessoa.  “sabe-se, actualmente, que a  incontinência é um sintoma e que, com diagnóstico correcto e intervenções apropriadas, pode ser revertida ou tratada eficazmente” (Marilyn et al, 2000. p. 453). Neste sentido, o enfermeiro de reabilitação tem um papel determinante, quer pelos seus conhecimentos técnico-científicos, quer pela relação que estabelece com o utente. “ocupa uma posição única para detectar disfunções vesicais não comunicadas e para proceder à avaliação e iniciar as intervenções necessárias ao tratamento das pessoas com incontinência urinária.” (Marilyn et al, 200,pág.253).

No âmbito do Curso de pós-licenciatura de enfermagem de reabilitação (módulo III – entre a intimidade e a vida social), foi-nos proposta a análise de uma situação clínica em que há  a evidência de problemas na área da eliminação. Após reflexão, discussão e pesquisa bibliográfica relacionada com as questões abordadas anteriormente, estruturámos este trabalho da seguinte forma:

Inicialmente, descrevemos a situação clínica (fictícia), revelando um conjunto de dados significativos e pertinentes para a análise da mesma, descritos por um dos cuidadores informais.  
Num segundo capítulo são definidas estratégias de clarificação (uma vez que a informação existente se revela insuficiente) e os recursos mobilizáveis. 
No capítulo seguinte e com base na informação disponível, são identificados os diagnósticos de enfermagem, teoricamente fundamentados, acerca dos problemas de eliminação identificados e vivenciados pelo utente/ actual elemento cuidador, sustentados pelo referencial dos diagnósticos da NANDA.  
Será apresentado um plano de intervenção individualizado que procura ter como base de sustentação a participação dos intervenientes no processo de planeamento e decisão. 
De seguida, apresentaremos as estratégias que considerámos adequadas para a avaliação do plano de intervenção e acompanhamento dos envolvidos. 
Concluímos com uma  breve síntese  onde  procuramos  transmitir a  nossa reflexão  acerca da importância da elaboração deste trabalho, dando visibilidade ao papel do enfermeiro de reabilitação e desenvolvimento de saberes nesta área.

Assim, para este percurso foram delineados os seguintes objectivos:
-          Descrever a situação em análise
-          Aprofundar conhecimentos sobre os mecanismos neurofisiológicos relativos à eliminação
-          Determinar estratégias de clarificação da situação
-          Elaborar um plano de cuidados de reabilitação face aos problemas identificados
-          Definir estratégias de avaliação e acompanhamento

Temos bem presente que “o prestador de cuidados tem por missão tentar ajudar a pessoa a criar uma maneira de viver portadora de sentido para ela e que seja compatível com a situação em que se encontra, seja qual for o estado do seu corpo e da natureza da sua afecção.” (Hesbeen, 2002, p. 76).



1. DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO

Neste capítulo, é apresentada a transcrição da situação relatada pela D. Helena  à  enfermeira especialista Margarida, do Centro de Saúde da área da residência. São manifestados os problemas relacionados com o pai, o Sr. Jerónimo, de quem é a cuidadora principal, no presente momento.
A D. Helena deslocou-se ao seu C. de Saúde para solicitar ao médico de família as receitas habituais e enquanto esperava abordou a enfermeira Margarida Saraiva dizendo-lhe que precisava de uma opinião. E disse-lhe o seguinte: “o seu pai, Jerónimo Soares, de 85 anos, que toda a vida tinha sido saudável que nem um pêro, tinha tido uma trombose há uns meses. Ele que sempre vivera na aldeia e que mesmo depois da mulher ter morrido, há já 15 anos, nunca precisara de ajuda, desde então, passava dois meses em casa de cada uma das seis filhas ainda vivas. Anda de casa em casa, de terra em terra.”
E continuava: “Ele tinha ficado muito afectado. Afectou-lhe a fala e não consegue mexer o braço e a perna direita, embora esta já “queira” ajudar qualquer coisa. Mas o pior não é isso. Perceber, já o vai percebendo. Levantá-lo para o sofá, deitá-lo à noite, ainda é o menos. Com a ajuda do filho lá se “desenrasca”, “mas as fraldas, menina enfermeira, isso é que eu não posso...”; è a toda a hora. Eu bem lhe digo: tem que pedir! Mas nada. Às vezes ponho-lhe o urinol para ver se faz e nada. Tiro-lho e é logo. Parece que faz de propósito. À noite ainda é pior. Não sei onde vai buscar tanta urina. Até já tem as partes a ficar “assadas”. Sim, porque depois também está sempre sujo de fezes, é uma diarreia que eu até já lhe dou água de arroz para ver se aquilo pára. Foi a minha filha que me disse que era o melhor, mas eu já não sei...está na mesma! É um dinheirão que estamos a gastar. Não acha que era melhor pôr-lhe uma “argália”? Pelo menos....


Durante o relato, a enfermeira foi definindo mentalmente algumas hipóteses de diagnósticos de enfermagem, baseadas nas informações fornecidas. Apesar de estarem presentes vários problemas, parecem emergir os relacionados com a incontinência vesical e intestinal e alteração da integridade cutânea. No entanto, a informação existente era insuficiente, tornando-se necessário definir estratégias a desenvolver com vista à clarificação da situação.

Entre muitos outros aspectos, desconhecemos quais os sentimentos do Sr. Jerónimo perante a situação; as suas capacidades físicas, cognitivas e funcionais; condições da habitação; relações familiares; hábitos e projectos de vida; Impacto da doença na vida pessoal e familiar; natureza da lesão causada pela patologia e localização; tentativas anteriores de resolução dos problemas até ao momento, bem como o seu grau de eficácia e aceitação por parte da família e do Sr. Jerónimo;

2. ESTRATÉGIAS DE CLARIFICAÇÃO

Pelas dúvidas suscitadas tornou-se essencial definir estratégias que promovam a clarificação da situação. Uma das principais, foi a realização da visita domiciliária.
... é um dos instrumentos mais indicados para se começar a trabalhar o indivíduo, a família e a comunidade na prestação de assistência à sua saúde, dentro do seu contexto social, desde que seja realizada mediante um processo racional e com objectivos definidos que estejam dentro dos princípios de eficiência”.  http://www.fsp.usp.br/MAZZA.HTM)às 18h10 do dia 10/11/2006)
Esta, possibilita uma avaliação global das necessidades, conhecimento dos projectos de vida do utente, da dinâmica familiar e recursos socioeconómicos, culturais e ambientais. Uma das grandes vantagens  reside no facto de permitir obter do indivíduo, família e comunidade, a sua participação e envolvimento no planeamento, operacionalização e avaliação do plano de reabilitação estabelecido, recorrendo aos recursos disponíveis. Pressupõe uma preparação e envolve várias fases:

Na fase do planeamento a enfermeira procurou reunir a informação disponível (através da consulta do processo de família),  formulou o plano da visita, preparou o material necessário para a recolha de informação (por exemplo o instrumento de colheita de dados) e delineou os objectivos iniciais:
           Conhecer o Sr. Jerónimo e família
Iniciar uma relação de proximidade e confiança
Proceder à avaliação das necessidades (dando prioridade às questões da eliminação)
Definir os diagnósticos de enfermagem
Desenvolver com o utente e elemento cuidador, um plano de cuidados individualizado

Efectuou contacto telefónico prévio para agendar a visita, confirmando a morada e obtendo informação sobre o estado de saúde do doente (RICE, 2004) .

A visita domiciliária não pressupõe um momento único. Poderão ser necessários outros (dada a complexidade da situação, das questões colocadas e cuidadores envolvidos), que possibilitem a avaliação do plano de intervenção estabelecido e reformulação das estratégias delineadas.
Por outro lado, os objectivos definidos poderão não ser atingidos na totalidade numa primeira visita.

 Na fase de execução, é fundamental o desenvolvimento de estratégias que promovam um clima de confiança e empatia, identificando, se possível, as expectativas da pessoa, e aquilo que mais a preocupa, a sua motivação para resolver os problemas, as suas capacidades de compreensão e adesão ao plano de intervenção. Quando a enfermeira procede à colheita de dados, necessária para cuidar da pessoa e agir em circunstâncias propícias a uma acção eficaz, como defende Hesbeen (2001, p.25), fá-lo de forma objectiva e dirigida às reais necessidades, evitando questões desnecessárias e supérfluas. Assim, tem oportunidade de interagir com a família e proceder a uma avaliação integrada na realidade familiar e social, podendo mesmo, utilizar o instrumento de colheita de dados, de forma mais individualizada, (Anexo I) sem carácter formal.

“… o que preocupa as pessoas que recebem cuidados não é responder às perguntas que lhe fazem, mas sim ser ouvido, ter a responsabilidade de partilhar o seu sofrimento ou o seu medo de sofrer, e ser um pouco familiarizado e um pouco tranquilizado no que respeita ao seu novo ambiente…” Hesbeen, 2003
Sendo identificada a principal preocupação (a incontinência), conhecer “as percepções do utente, dos prestadores de cuidados e de outras pessoas significativas acerca da incontinência são dados importantes para a história” (Marilyn et al, 2000, p. 469).

Para além das informações obtidas através dos intervenientes, é importante a consulta de documentos que façam referência ao estado de saúde do Sr. Jerónimo, como a carta de alta de enfermagem e médica, exames complementares de diagnóstico efectuados, de forma a conhecer a localização e extensão da lesão, evolução clínica e estratégias instituídas durante o período de internamento. A consulta de documentos de registo de cuidados no domicílio por parte dos enfermeiros do centro de saúde, da área de residência das outras filhas, é fundamental, bem como, o contacto telefónico com o objectivo de validar/obter informações e preparar o trabalho em equipa.

Para além do que foi referido anteriormente, a  enfermeira de reabilitação procura conhecer o  projecto de vida da pessoa (expectativas e preferências de vida futura) e como esta gostaria de ser ajudada. A sua participação é fulcral para que seja possível estabelecer um plano de intervenção adequado e individualizado com maiores probabilidades de ser bem sucedido. “convirá ter bem presente que só um caminho com sentido – que faça sentido para a vida de alguém – obterá a adesão e a participação da pessoa que o prestador de cuidados pretende acompanhar” (Hesbeen, 2001, pág.25).
Reportando-nos à nossa situação, interessa compreender, claramente, a composição do agregado familiar da D. Helena e, atendendo às suas necessidades e recursos, avaliar qual o contributo de cada elemento.

Após ter constatado que as principais preocupações do Sr. Jerónimo estão relacionadas com a eliminação, todas as estratégias de intervenção (incluindo o instrumento de colheita de dados) serão desenvolvidas tendo em conta esta constatação. Assim, a partir deste momento é possível definir outras estratégias de clarificação. É fulcral não perder de vista a ideia apresentada por Marilyn et al:
“... a incontinência representa um estigma social. Não só existem pessoas embaraçadas e relutantes em falar da sua incontinência, como também é comum definirem o problema de forma diversa. É crucial estar ciente e sensibilizado para os problemas emocionais que os utentes associam à incontinência” (Marilyn at al, 2000, p.469).

Nesta linha de pensamento, a enfermeira procurará conhecer:
  • As características da incontinência urinária e intestinal, numa tentativa de determinar o tipo (inicio, duração, frequência); factores precipitantes; quantidade de urina/fezes perdidas em cada episódio; emissão breve ou súbita; momentos de ocorrência da incontinência (dia, noite); presença concomitante de incontinência de fezes ou outras alterações de hábitos intestinais, sensação de plenitude vesical antes de urinar; capacidade de adiar a micção depois de ter a percepção da vontade de urinar; sintomas de disúria, hesitação, polaquiúria, hematúria; como gere a sua incontinência, se já fez tratamentos para resolver a incontinência e se foram eficazes; se foi submetida a cirurgias genito-urinárias; antecedentes pessoais de doença e medicação realizada por exemplo diuréticos (que lhe aumenta a diurese e favorece a obstipação) ou laxantes (emolientes das fezes); conhecer as doenças associadas, uma vez que, nesta situação concreta, “as doenças neurológicas com lesões neuropatológicas em áreas corticais ou subcorticais, tais como acidentes vasculares cerebrais...podem dar origem a disfunções neurogénicas da bexiga e, consequentemente, a incontinência de urgência.” (Marilyn et al, 2000, p. 469). Estas e outras questões, são apresentadas de forma mais pormenorizada, no instrumento de colheita de dados (anexo I).
  • Caracterizar padrão de eliminação anterior ao acidente vascular cerebral, com o objectivo de definir estratégias que permitam recuperar hábitos anteriores
  • Averiguar como são efectuados os cuidados de higiene e conforto perineal

, procurando      saber quando? Quem? Com o quê? Em que condições? E com que motivação e/ou constrangimentos? Será que a filha se sente à vontade por fazer a higiene do pai? Tem os conhecimentos necessários?



·         Efectuar exame físico que “inclui a avaliação funcional física e cognitiva, a observação do abdómen e das regiões pélvica e rectal, assim como o exame neurológico e geral” (Marilyn, 200, p.469). Na avaliação funcional física a enfermeira avalia a mobilidade e destreza da pessoa para alcançar o sanitário/urinol e se é capaz de se despir a tempo, ou se necessita de ajuda. A avaliação da cognição permite verificar se o Sr. Jerónimo sente vontade de urinar, se compreende como pode chegar ao WC/urinol e como deverá usá-lo. Na observação do abdómen, efectua a observação da pele (se há lesões). Na palpação despista a existência de massas, se a bexiga está ou não distendida e se há zonas de hipersensibilidade. No caso do Sr. Jerónimo é conveniente averiguar o estado da pele dos órgãos genitais e características lesões existentes. O exame rectal:
“visa pesquisar a sensibilidade perineal, o tónus esfincteriano em repouso e em contracção activa, massas rectais e fecalomas...as dimensões, consistência e contorno da próstata devem ser determinados...o reflexo bulbocavernoso durante o exame rectal para determinar o estado do arco reflexo” (Marilyn, 2000, p.470).
Serão apresentados (em anexo II) o resumo dos principais aspectos a ter em conta no histórico de enfermagem e exame físico.

  • A análise sumária da urina possibilita detectar aspectos que contribuam para a incontinência urinária. Poderá ser necessária a intervenção do médico de família no sentido de requisitar outros exames complementares de diagnóstico ou prescrever medicação. Aliás, toda a intervenção deve ser baseada num trabalho em equipa.
  • É conveniente, antes de instituir qualquer programa de reabilitação, em colaboração com a família, efectuar o registo da eliminação urinária e intestinal, onde constam o local e horário das micções, quantidade, episódios de incontinência, factores associados, características da urina, etc (anexo III), para que as intervenções possam ser ajustadas à realidade.
  • Avaliar as condições do domicílio e acessibilidade ao sanitário/urinol (de forma estabelecer objectivos tangíveis).
Para colocar em prática o tratamento mais adequado, é fundamental que o enfermeiro de reabilitação respeite as preferências individuais e conveniências do Sr. Jerónimo e família, que podem ser diferentes de outros utentes e outras famílias. É de realçar que, depois de devidamente informados e alertados para os benefícios e riscos existentes, cabe à pessoa optar pela solução que considere mais adequada à sua situação de vida.  A partir deste momento, ficarão abertos caminhos para a definição de estratégias de avaliação, com a participação do doente e família que o cuida actualmente, serão disponibilizados contactos telefónicos e  combinadas outras visitas. Após a visita, continua a fase da execução, uma vez que há ainda um conjunto de estratégias de articulação a colocar em prática de forma a averiguar as necessidades e problemas das outras filhas, dando início a um percurso semelhante (embora noutros locais e com outros cuidadores informais).

A fase registo de dados tem como objectivo favorecer e orientar a continuidade do trabalho. É fundamental para a avaliação da intervenção e acompanha todo o processo, quer da visita, quer da implementação do plano de intervenção. Sem esta, fica comprometida a continuidade de cuidados e a avaliação das intervenções. Os registos elaborados facilitarão a continuidade de cuidados por parte dos outros enfermeiros dos outros centros de Saúde da área de residência das outras filhas.

Nenhum plano estará concluído se omitirmos a fase de avaliação. Sem ela, permanecerão dúvidas relativamente ao sucesso do plano definido, mesmo que este tenha sido exemplarmente executado. A avaliação é sempre uma comparação entre os resultados esperados e os resultados obtidos. Determina se os objectivos foram atingidos e se o planeamento foi adequado. Abordaremos adiante mais pormenores desta fase.

3. RECURSOS MOBILIZÁVEIS

Ao longo do capítulo anterior foram-se vislumbrando alguns recursos mobilizáveis. No entanto, para que esta questão fique clarificada, considerámos importante descrevê-los mais pormenorizadamente neste capítulo.
“o processo de reabilitação para além da pessoa que recebe cuidados e da sua família, recorre a inúmeros intervenientes…a multiplicidade da equipa de reabilitação é vital, porque oferece ao doente um ambiente humano diversificado, essencial à vida em sociedade. O doente pode assim, conjugar mais facilmente os efeitos das relações formais e informais…” Hesbeen,2003
Neste contexto torna-se importante identificar os seguintes recursos:
Motivação do Sr. Jerónimo. Sem esta não existe envolvimento nem participação.
 “a natureza do projecto de vida da pessoa, a percepção que ela tem sobre a sua afecção e do seu futuro, a sua vontade de se curar, que não consegue por imposição, são também elementos que vão agir sobre a sua adesão ao que está a ser tentado, sobre a sua motivação.”(Hesbeen, 2001, p.76)
A sua história de vida, experiências e conhecimentos são recursos a valorizar e que por vezes influenciam o sucesso ou insucesso de um plano de reabilitação.

Identificação dos prestadores de cuidados envolvidos. Apesar de pensarmos que o ideal seria reunir todas as filhas e em conjunto elaborar o plano de reabilitação, após a recolha de toda a informação disponível, por opção, não o fizemos, porque, na realidade, raramente isto é possível. No entanto, fica a salvaguarda que, se essa intervenção fosse exequível, optaríamos por a colocar em prática. Com a nossa escolha, poderemos acautelar um ambiente mais calmo, sem tanta confusão, dado o número significativo de filhas que participam no cuidado ao Sr. Jerónimo (6). No entanto, para posterior articulação com os outros cuidadores formais, a identificação dos cuidadores é um recurso a valorizar e a incluir no processo. “cada prestador de cuidados dispõe, portanto, de meios que lhe permitem contribuir, ás vezes modestamente, para o cuidar de determinada pessoa e dos seus próximos.” Hesbeen, 2003, p.69) e o valor reside na aliança entre todos os contributos.
Avaliação dos conhecimentos, capacidades, contributos individuais  e  motivação para cuidar do Sr. Jerónimo. É importante conhecer o que as pessoas sabem e quais as suas capacidades para aprender; se estão interessadas em ajudar e como podem fazê-lo. Obviamente, o principal protagonista é o Sr. Jerónimo.
Avaliação da percepção dos mesmos relativamente ao problema da incontinência e interferência desta na dinâmica familiar. As preocupações manifestadas pela D. Helena e a opção por ela sugerida, permite-nos constatar a necessidade de esclarecimento em algumas áreas, como por exemplo: questões relacionadas com o acidente vascular cerebral; impacto da doença nas actividades de vida diária, concretamente ao nível da eliminação; consequências e riscos da algaliação; possibilidades de tratamentos da incontinência.
“o primeiro passo na ajuda aos cuidadores começa pela informação da oferta de serviços disponíveis...o acesso à informação não implica que a família e o cuidador passem a usar esses mecanismos. No entanto, esta informação pode ajudar o cuidador a sentir-se mais apoiado. As pessoas não podem fazer escolhas ou tomar decisões correctas se não dispõem de informação credível” (Martins, 2006, p.244-245)


Avaliação das condições da habitabilidade e recursos económicos, com o objectivo de saber se têm possibilidades de adquirir ajudas técnicas necessárias ou material de apoio (urinol, andarilho, barra de apoio lateral na casa de banho, intercomunicador, fraldas, resguardos, dispositivo urinário, cremes).

Criação rede informal de suporte (elementos da família, amigos ou vizinhos indicados pelo utente) e ponderar a necessidade de colaboração de outras estruturas de apoio (Centro de dia, apoio para cuidados de higiene ou alimentação) com o objectivo de diminuir a sobrecarga da filha.



Negociação de estratégias de actuação com doente/ família, ou seja, o utente estará no centro do processo de decisão e serão respeitadas as suas escolhas. A enfermeira procurará “...oferecer um mapa das estradas à pessoa e utilizar os seus recursos para dialogarem sobre as diferentes possibilidades e para a acompanhar na escolha que tenha feito.”  (Hesbeen, 2003, p.76).




Articulação com cuidadores formais e informais (através de contactos telefónicos diários numa primeira fase, visitas domiciliárias, registos  informatizados).

“o valor de uma equipa manifesta-se pela capacidade que os diferentes prestadores de cuidados desta equipa têm para, com os recursos de que dispõem, articular os meios de modo a oferecerem à população uma verdadeira combinação de competências.” (Hesbeen, 2003, p. 69)



Coordenação com os prestadores informais de cuidados para actuarem de maneira semelhante na execução do plano terapêutico. Como refere Martins (2006), “cuidadores e doentes poderão beneficiar de melhores cuidados se as redes formais e informais e respectivos técnicos e voluntários se articularem.” (p. 246) de forma a que todos consigam alcançar os objectivos definidos.


Validação da continuidade de cuidados quer por parte dos cuidadores formais dos outros centros de saúde, quer por parte dos cuidadores informais. A enfermeira de reabilitação assume um papel de coordenadora de todo o processo.



5. PLANO DE INTERVENÇÃO

Ao longo dos anos a enfermagem e o seu papel foram sofrendo alterações. Durante este processo evolutivo ascendeu-se de uma fase de cuidados prestados por caridade para outra que possui o seu próprio corpo de conhecimentos, baseados em teorias científicas, onde o principal enfoque reside na prestação de cuidados centrados na satisfação das necessidades do doente e família.

O Processo de Enfermagem é fulcral na prestação de cuidados de enfermagem. É um método eficaz de criar e organizar os processos de pensamento para a tomada de decisão que proporcionam a resolução de problemas de forma individualizada e com qualidade. Este é constituído por cinco fases: Avaliação, identificação dos problemas, planeamento, implementação e avaliação final. Nesta dinâmica é fundamental não descurar o envolvimento do doente/família na criação do processo de cuidados de forma a que este seja bem sucedido.
“ O processo é aquele que permite elaborar coma pessoa que é cuidada e, consoante a sua situação, com os seus familiares um projecto de cuidados, ou seja, identificar com ela um horizonte para o qual pretende progredir.” (Hesbeen, 2000, p103)

Os diagnósticos de enfermagem constituem a etapa final da segunda fase do processo de enfermagem. “é um julgamento clínico sobre respostas individuais, familiares e comunitárias a problemas de saúde de vida reais ou potenciais… proporciona uma base para a relação das intervenções de enfermagem a fim de obter os resultados pelos quais a enfermeira é responsável” Doenges, e tal (1994, pág. 38).
Como vantagens desta metodologia realçamos:
  • Identificar as necessidades dos doentes com o objectivo de melhor as ajudar;
  • Proporcionar cuidados de maior qualidade, personalizados e humanizados,
  • Proporcionar uma linguagem comum
  • Contribuir para um efectivo trabalho em equipa
  • Conferir maior importância à prevenção
  • Desenvolver o papel da enfermeira no seio da equipa multidisciplinar
  • Ampliar o saber em enfermagem (ver 2001, pág.190 e 191)

Nesta perspectiva, pelo que foi referido, optámos por, depois de uma recolha sistemática dos dados relacionados com o doente e respectiva análise (1ª fase), proceder à identificação dos problemas e necessidades do senhor Jerónimo e sua família (2ª fase). De seguida, na fase de planeamento estabeleceram-se objectivos de forma a perceber que resultados se pretendem alcançar, definidas estratégias individualizadas e adaptadas ao doente/família de modo a elaborar o plano de cuidados que melhor se adeqúe às necessidades identificadas para posterior aplicação.
 Em qualquer momento, é possível proceder a uma reformulação dos objectivos e estratégias estabelecidas de forma a dar resposta mais adequada ao problema identificado.


Diagnóstico de enfermagem        
Incontinência Urinária relacionada com lesão neurológica, manifestada por incapacidade de controlar voluntariamente a micção.


clip_image001Motivar o Sr. Jerónimo e família para o programa de reeducação

clip_image001[1]Promover  maior independência possível na sua eliminação

clip_image001[2]Obter uma resposta vesical adequada

clip_image001[3]Melhorar a auto-estima e autoconfiança do Sr. Jerónimo

Objectivos:
·         Motivar o Sr. Jerónimo e família para o programa de reeducação;
·         Tornar o Sr Jerónimo o mais independente possível na sua eliminação;
  • Obter uma resposta vesical adequada
  • Melhorar a auto-estima e autoconfiança dos Sr. Jerónimo.

Intervenções:
·         Identificar se o Sr. Jerónimo e a filha se encontram motivados para aderirem ao programa de reeducação e qual a capacidade do elemento cuidador para ensinar os restantes.
·         Informar o Sr Jerónimo e cuidador informal, utilizando linguagem adaptada aos mesmos, acerca das consequências do AVC no controle da eliminação vesical. Elucidar que uma vez sentida a vontade, o fluxo não pode ser interrompido. No entanto, poderão ser combinadas estratégias de forma a reverter/tratar a incontinência urinária;
·         Falar com o Sr. Jerónimo sobre a situação de incontinência e explicar-lhe que esta é consequência do seu problema de saúde e que não deve sentir-se diminuído.
·         Informar todos os envolvidos acerca dos diversos dispositivos alternativos existentes no mercada, reforçando os riscos de uma algaliação e que esta deve ser sempre o último recurso.
·         Estabelecer o padrão urinário (fazendo registo das micções durante uma semana) anexo
·         Durante este período ponderar a utilização do dispositivo urinário externo (essencialmente durante a noite) porque permite obter informação sobre volume drenado, características da urina e horário provável da micção; proporcionar sensação de bem estar e conforto ao Sr. Jerónimo e aliviar a sobrecarga de cuidados referida pela filha.
·         Ajustar os horários da micção de acordo com o registo efectuado e dinâmica familiar
·         Delinear o programa de reeducação urinária, baseado em técnicas comportamentais, envolvendo o Sr Jerónimo e cuidador informal. Este programa contempla as seguintes actividades:
                  1 – Oferecer o urinol antes da hora prevista (de acordo com o registo·                  miccional diário efectuado) e relembrar o doente do que está a ser feito
                  2 – Dar reforços positivos quando a actividade tem sucesso e                                                       não conotar negativamente quando não tem
                  3 - Elaborar um plano de ingestão hídrica adequado ao Sr Jerónimo:
§   Ingerir diariamente 1,5 a 2 litros;
§   Reduzir a partir das 18 horas;
§   Suspender 2 horas antes de deitar;
§  Restringir a ingestão de líquidos com efeito diuréticos ( café, chá, bebidas alcoólicas e sumo de laranja
                  4 – Estimular a micção em horário regular para a sua reeducação (abrir                              torneira, colocar as mãos em água, estimular a região perineal com                                 salpicos, etc)
                        5 - Proporcionar  privacidade e  ambiente calmo  no momento da micção;

                  5 – Ensinar como pode reforçar os músculos perineais (contracção dos                             músculos posteriores e anteriores) – anexo
                  6 – Acordar com o Sr Jerónimo um código alternativo à comunicação                   verbal ( ex. bater com uma colher)
                  6 - Efectuar higiene da região púbica depois de cada micção

  • Usar uma protecção contra perdas de urina (fralda, resguardo ou mesmo dispositivo urinário) explicando a sua utilidade
  • Articulação com o médico de família no sentido de ponderar a necessidade de prescrição de terapêutica anti-colinergica com o objectivo de diminuir a contractilidade vesical
  • Informar sobre as vantagens da utilização de roupa fácil de retirar que facilite o acesso ao urinol.
  • Colocar o urinol em local acessível ao Sr  Jerónimo, preferencialmente no raio de acção do membro não afectado
  • Explicar todo o processo de reeducação á família, envolvendo-a  e valorizando a sua participação

  • Avaliar a eficácia das intervenções determinando se os objectivos estabelecidos foram atingidos:
Elaborar um instrumento próprio de registo das micções e intercorrências
Avaliação telefónica diária, proporcionando troca de informação entre o enfermeiro especialista em reabilitação e o prestador de cuidados
Estabelecer com o Sr Jerónimo e família  a periodicidade das próximas visitas domiciliárias

  • Divulgar e explicitar o plano estabelecido aos cuidadores formais da área de residência dos outros familiares, referenciando em que fase do plano nos encontramos, resultados atingidos e colaboração dos familiares
  • Promover uma comunicação eficaz entre os cuidadores formais dos centros de saúde envolvidos
  • Facultar um contacto telefónico permanente aos cuidadores formais e informais, assumindo o enfermeiro especialista em reabilitação o papel de gestor de caso.

  




Diagnóstico de enfermagem
Objectivo
Intervenções
Avaliação
Alteração da eliminação vesical relacionado com bexiga neurogénica desinibida manifestado por incontinência urinária (polaquiuria, noctúria, urgência)
OU
Alteração da auto-estima do sr. Gerónimo relacionado com a incontinência urinária  manifestado pelo que o doente refere “estou sempre sujo. Parece que faço de propósito. Não sirvo para nada” (SIC)

·         Motivar o doente e família para o programa de reeducação;
·         Tornar o doente o mais independente possível na sua eliminação;
  • Obter uma resposta vesical adequada ao doente;
  • Melhorar a auto-estima e autoconfiança dos sr Jerónimo.


Identificar se doente/cuidador se encontram motivados para aderirem ao programa de reeducação e qual a capacidade do elemento cuidador para ensinar os restantes cuidadores. “nenhum programa de reabilitação pode resultar sem a cooperação do individuo em questão” Phips (1990, pág. 582)”
Informar o doente/elemento cuidador, utilizando linguagem adaptada aos mesmos, acerca das consequências do AVC no controle da eliminação vesical.
Elucidar que uma vez sentida na vontade o fluxo, não pode ser inibido. No entanto, poderam ser combinadas estratégias de forma a reverter/tratar a incontinência urinária;
Estabelecer o padrão urinário (fazendo registo das micções) anexo
Planear o programa de reeducação urinária:
1 – oferecer o urinol antes da hora prevista para urinar e informar o doente do que está a ser feito
2 – dar reforços positivos quando a actividade tem sucesso e desvalorizar quando não tem
3 – instituir ingestão hídrica adequada
4 – estimular a micção em horário regular para a sua readucação (abrir torneira, colocar as mãos em água, estimular a região perineal com salpicos, etc)
5 – ensinar como pode reforçar os músculos perineais (contracção dos músculos) – anexo
informar o doente e cuidador que deve: evitar o consumo de café, chá, bebidas alcoólicas, sumo de laranja
Efectuar higiene da região púbica depois de cada emissão
·         Motivar o utente/família para o uso de métodos terapêuticos não invasivos. A algaliação é o último recurso a utilizar na gestão da incontinência (Heath & Watson, 2002);

·         Ensino sobre como em ambiente seguro o Sr. Jerónimo pode maximizar o auto cuidado, ao executar a actividade de vida diária eliminação com eficácia e privacidade.

·         Ensino sobre o uso de roupa adaptada, fácil de retirar, que facilite o acesso ao urinol ou aos sanitários (Brooks, 2004).


Compromisso na comunicação verbal relacionado com AVC manifestado por alterações da fala “…………………………………….



Alteração do padrão intestinal relacionado com intestino neurógénico desinibido manifestado por